quinta-feira, 21 de maio de 2009

Parecer do Ministério Público


Ao abrigo dos artigos 3.º/1 do Estatuto do Ministério Público, 85.º/2 CPTA e 219.º CRP, o Ministério Público é competente para se pronunciar sobre o mérito da causa, em defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, dos interesses públicos especialmente relevantes ou de algum dos valores ou bens enunciados no artigo 9.º/2 CPTA.

O projecto em causa está sujeito a avaliação de impacto ambiental, de acordo com o artigo 1.º/3 b) e Anexo II, ponto 3 i) do Decreto-Lei n.º 69/2000, de 3 de Maio (doravante designado por Regime AIA, tendo sido posteriormente alterado pelo Decreto-Lei n.º 197/2005, de 8 de Novembro), integrando, assim, uma área sensível, designadamente, da Rede Natura 2000, regulada pelo Decreto-Lei n.º 49/2005, de 24 de Fevereiro (vide artigo 2.º/b) ii) Regime AIA). Portanto, não foi respeitado o limite máximo de 10 torres previsto no Anexo II, ponto i) Regime AIA.

O projecto referido integra ainda o âmbito do Regime PIN +, segundo o artigo 2.º/3 c) do Decreto-Lei n.º 285/2007, de 17 de Agosto (doravante designado Regime PIN +), uma vez que, in casu, se destina à promoção, eficiência e racionalização energéticas, maximizando a utilização de recursos energéticos renováveis.

Para a classificação do projecto como PIN +, a lei exige a apresentação do requerimento previsto no artigo 3.º/1 Regime PIN +. A proposta de classificação do projecto como PIN + deveria ter sido obrigatoriamente precedida da audição da Câmara Municipal de Vilar de Brisa do Mar, devendo esta ter-se pronunciado, no prazo de 10 dias, sobre o interesse do projecto em causa e da admissibilidade da localização proposta, conforme resulta claro do disposto no artigo 4.º/2 Regime PIN +. A classificação do projecto em causa deve ainda ser “(…) efectuada por despacho conjunto dos ministros responsáveis pelas áreas do ambiente, do ordenamento do território e desenvolvimento regional e da economia, bem como dos demais ministros competentes em razão da matéria” (artigo 6.º/1 Regime PIN +).

O requerimento supra mencionado para classificação do projecto como PIN + foi apresentado, conforme consta dos articulados, no dia 1 de Setembro de 2008, juntamente com o pedido de dispensa de procedimento de avaliação de impacto ambiental, nos termos do artigo 3.º/1 e 2 Regime AIA, tendo a este propósito a Câmara Municipal de Vilar de Brisa do Mar, 15 dias a contar da data de entrega do requerimento de dispensa de procedimento de AIA para se pronunciar sobre o mesmo e remetê-lo à autoridade de AIA (artigo 3.º/3 Regime AIA).

Nos termos do artigo 3.º/7 Regime AIA, o Ministro responsável pela área do ambiente e o Ministro da tutela decidem do pedido de dispensa de procedimento de avaliação de impacto ambiental, no prazo de 20 dias contados da recepção do parecer da autoridade de AIA. Contudo, dispõe o artigo 18.º/1 Regime PIN +, que nos casos em que se pretenda obter a dispensa do procedimento em causa o respectivo requerimento deve ser apresentado, em conjunto com o requerimento de classificação do projecto como PIN +, junto da CAA-PIN, verificando-se uma redução dos prazos que resultam do artigo 3.º/7 Regime AIA (20 dias) para metade, ou seja, 10 dias (artigo 18.º/2 Regime PIN +). A decisão sobre a dispensa de AIA é, então proferida pelos ministros competentes no despacho conjunto previsto no artigo 6.º Regime PIN + (artigo 18.º/3 Regime PIN +). Acresce ainda que, nos termos do artigo 17.º/1 Regime PIN +, o procedimento de AIA corre os seus trâmites nos termos do respectivo regime jurídico, atendendo-se às especificidades do Regime PIN + e sem prejuízo de ambos os procedimentos correrem em simultâneo, nos termos do artigo 12.º/1 Regime do PIN +.

O Governo pronunciou-se pela dispensa do procedimento de AIA, no dia 2 de Janeiro de 2009, invocando, conforme consta dos articulados, “o profundo interesse nacional em causa” e a “necessidade de Portugal diversificar as suas fontes de energia”, fundamentos que, a nosso ver, não preenchem as “circunstâncias excepcionais e devidamente fundamentadas” exigidas pelo artigo 3.º/1 do Regime AIA e 124.º e 125.º CPA, relativos à exigência de fundamentação dos actos administrativos.

Assim, não deveria ter havido dispensa do procedimento de AIA por violação do disposto no artigo 3.º/1 e 7 do Regime AIA, com o consequente indeferimento de dispensa do procedimento de AIA (artigo 3.º/11 Regime AIA). Isto significa a obrigatoriedade de ser seguido o procedimento previsto nos artigos 12.º e seg. do Regime AIA.

Uma última questão que importa analisar relaciona-se com o facto de a autoridade de AIA dever promover a publicitação do procedimento de AIA, no prazo de 15 dias contados da declaração de conformidade a que se refere o artigo 13.º do Regime AIA (artigo 14.º/1 do Regime AIA).

In casu, o prazo que João Siroco teria para consulta situar-se-ia entre 20 a 30 dias, conforme resulta do artigo 14.º/2 b) do Regime AIA, sendo considerado “público interessado” para efeitos do disposto nos artigos 2.º/r) e 14.º/3 do mesmo diploma.

No prazo de 15 dias após a realização da consulta pública em causa, a autoridade de AIA envia ao Presidente da Comissão de Avaliação o relatório da consulta pública (artigo 14.º/5 do Regime AIA), devendo a autoridade de AIA responder por escrito, no prazo de 30 dias, aos pedidos de esclarecimento que lhe sejam dirigidos por escrito pelos interessados (artigo 14.º/6 do Regime AIA).

Assim, o Ministério Público conclui o seguinte:

O projecto em causa está obrigatoriamente sujeito, como ficou supra exposto, a avaliação de impacto ambiental, não podendo haver dispensa do mesmo procedimento, por ter havido violação do disposto no artigo 3.º do Regime AIA, relativamente a prazos, autoridade competente e fundamentação, seguindo-se, consequentemente, o procedimento normal previsto nos artigos 12.º e seguintes do mesmo regime, sem prejuízo de correr em simultâneo com o procedimento relativo à classificação do projecto como PIN +.

João Siroco é “público interessado”, nos termos dos artigos 2.º/r) e 14.º/2 e 3 do Regime AIA, não lhe devendo ser negado o direito de participação no procedimento em causa, conforme resulta do artigo em causa.



Os Magistrados do Ministério Público,
Ana Filipa Freitas (subturma 1)
Ricardo Santos (subturma 1)