sábado, 23 de maio de 2009

Parecer do MP ( Subturma 12)

Exmos. Senhores Juízes de Direito do Supremo Tribunal Administrativo

Parecer do Ministério Público:



Foram intentadas Acções Administrativas Especiais em que foram formulados os seguintes pedidos:
- De impugnação de acto administrativo em cumulação com a intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões por parte de João Siroco;
- De declaração de nulidade de acto administrativo e anulação de actos administrativos posteriormente praticados pelo Presidente da Câmara de Vilar de Brisa do Mar;
- De Impugnação de acto administrativo por parte de Emílio Bronte;

Nos termos do nº1 do artigo 219º da CRP, dos artigos 9º nº2 e 85º nº2, ambos do CPTA, vem o Ministério Público pronunciar-se sobre o mérito da pretensão, por estar em causa a defesa de interesses públicos especialmente relevantes e de valores e bens constitucionalmente protegidos na área do ambiente, emitindo o seguinte parecer:

Quanto à qualificação do projecto como PIN+ e da dispensa de AIA:

O PIN tem como objectivo a dinamização do investimento empresarial associado a actividades que diversifiquem a base económica existente, criem emprego qualificado e apresentem características que lhes permitem gerar mais valor acrescentado.
Os PIN+ revestem-se de especial importância estratégica exigindo uma tramitação mais célere, sendo seleccionados de entre os projectos cujo reconhecimento como PIN haja sido requerido nos termos do Regulamento de Sistema de Reconhecimento e Acompanhamento de Projectos de Potencial interesse Nacional ( artigo 3º nº 1, artigo 1º nº1 e artigo 2º nº1 do Decreto Lei 285/2007).
A competência para a proposta de classificação como PIN+ cabe à CAA-PIN (Comissão de avaliação e acompanhamento de projectos PIN ), nos termos do artigo 5º nº1 do Decreto Lei 285/2007.
A respectiva classificação é da competência conjunta dos ministros responsáveis pelas áreas do ambiente , economia e outros em razão da matéria. Esta classificação é feita mediante Despacho conjunto dos referidos ministros (artigo 6º nº1 do Decreto Lei 285/2007).
Neste procedimento pode ter lugar a dispensa de AIA (artigo 6º nº5 alinea f) do Decreto Lei 285/2007), decisão essa que é proferida no âmbito do referido despacho conjunto ( artigo 18º nº 3 do Decreto Lei 285/2007).
No caso em apreço foi feita uma proposta de classificação como PIN +, sendo pedido também a dispensa de procedimento de AIA.
Na Petição Inicial afirma-se que o projecto de construção do Parque eólico se situa em zona inserida na Rede Natura 2000. Ora, a ocorrer tal situação, este projecto estaria necessariamente sujeito a AIA, na medida, em que as zonas abrangidas pela Rede Natura 2000 são áreas sensíveis para efeitos da distinção estabelecida no anexo II do Decreto lei 69/2000, conforme resulta do artigo 2º alínea b) , ii) desse mesmo Decreto lei.
Porém, da conjugação do artigo 1º nº3 alinea b) e ponto 3 alinea i) do anexo II, e, uma vez que o projecto prevê a construção de 15 torres, verifica-se que se ultrapassa o limite de 10 torres previsto nessa mesma alínea para os casos de áreas sensíveis.
Por se tratar de um projecto não inserido na Rede Natura 2000 ( de acordo com o documento 3 apresentado pelo Conselho de Ministros) a classificação do projecto como PIN +, não tem relevância para a isenção de AIA porque :
a) O projecto prevê a construção de um Parque Eólico com 15 torres, não sendo deste modo abrangido pelo artigo 1º nº3 al. b) do decreto lei 232/2007 que remete para o anexo II, nº3 al. i) - que apenas exige AIA quando esteja em causa a construção de um Parque Eólico com 20 ou mais torres.
b) Nos termos do artigo 1º nº4 do DL 232/2007 são ainda sujeitos a AIA os projectos do anexo II, ainda que não abrangidos pelos limiares neles estabelecidos( 20 ou mais torres) que sejam considerados, por decisão da entidade licenciadora ou competente para a autorização do projecto susceptíveis de provocar impacto significativo no ambiente em função da sua localização , dimensão ou natureza de acordo com os critérios estabelecidos no anexo V , os quais não estão verificados.
c) Embora o procedimento previsto no artigo 18º do DL 285/2007 não fosse necessário por não ser exigível a AIA do projecto em causa (visto não ser um projecto inserido na Rede Natura 2000) a classificação como PIN + desencadeia uma série de efeitos que legitimam os interesses das partes demandadas, nomeadamente, a apreciação prioritária junto de quaisquer entidades, órgãos ou serviços da administração (artigo 7º nº1 al. b) do DL 285/2007).

Quanto ao acto emitido pelo Conselho de Ministros

Houve uma resolução do conselho de ministros a dispensar a AIA. No entanto, esta não era necessária (por não se tratar de um terreno incluído na REDE NATURA 2000). Mas, ainda que fosse necessária a sujeição do projecto AIA como alegam os autores na P.I., a intervenção do conselho de ministros e não dos ministros do ambiente e do ordenamento do território e da tutela (art 3 nº1 DL 69/2000) não consubstancia uma incompetência absoluta como foi alegado pelos autores. À partida, cada ministério tem as suas atribuições, daí que a violação das mesmas consista numa incompetência absoluta, geradora de nulidade (artigo 133/a al. b) CPA). No entanto, o escopo desta norma não parece abranger as situações em que o conselho de ministros, orgão constituído por todos os ministros, delibere sobre matérias relativas a atribuições de um ou mais ministérios. Deste modo, conclui-se que estamos perante uma incompetência relativa que gera mera anulabilidade, nos termos do 135º do CPA.
Na PI, os autores referem-se a uma resolução do conselho de ministros, sendo que na contestação apresentada pelo conselho de ministros tal situação é esclarecida e definida como sendo um despacho conjunto (despacho 69/2000).
Uma vez que a classificação de um projecto como PIN+ necessita de um despacho conjunto nos termos do artigo 6º nº1 DL 285/2007, produzindo os seus efeitos apenas com a resolução do conselho de ministros (artigo 29º do mesmo DL) e como esta não se verificou, o PIN+ nunca chegou a produzir efeitos, de acordo com o artigo 29º nº3 e artigo 7º nº2. Salientamos que não ocorreu nenhum indeferimento tácito, na medida em que o governo apenas recebeu a proposta de classificação como PIN+ no dia 18 de Março de 2009, tendo sido o despacho conjunto emitido a 31 de Março do mesmo ano (assim se respeitando o prazo estabelecido no artigo 6º nº2 do DL 285/2007).


Quanto ao Plano de Pormenor

Os planos de Ordenamento do Território vêm previstos na Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de Urbanismo, Lei n.º 48/98 de 11 de Agosto, e no diploma que desenvolve a Lei da Bases, o Decreto-lei n.º 380/99 de 22 de Setembro.
Os Planos Municipais de Ordenamento do Território são instrumentos de gestão territorial previstos nos diplomas referidos (artigos 9º/2 e 32º da Lei de Bases e 2º/4 e 69º e seguintes do Decreto-lei).
Os Planos de Pormenor são uma modalidade de Plano Municipal de Ordenamento de Território (artigos 9º/2 alínea c) da Lei de Bases e 2º/4 alínea b) do Decreto-lei).
A elaboração de Planos Municipais do Ordenamento do Território obriga a identificar e a ponderar os projectos com incidência na área em causa, quer os já existentes, quer os futuros projectos (artigo 74º/3 do Decreto-lei).
O plano de Pormenor foi sujeito a uma avaliação de impacte ambiental estratégica ao abrigo do DL 232/2007 de 15 de Junho. O facto de o PP ter sido alvo do mesmo, não afasta a necessidade de se ter de proceder a uma avaliação de impacte ambiental. O que sucedia era que essa avaliação podia e devia ter em conta os resultados do relatório ambiental e da declaração ambiental da avaliação estratégica do plano, na medida em que esses elementos ainda fossem adequados e actuais ( artigo 13.º/3 do Decreto-Lei 232/2007).
No entanto, como ficou dito, não havia sujeição a AIA, nos termos do Decreto-Lei 69/2000.

Quanto à competência para a emissão do alvará

A construção do parque eólico carece de licenciamento por parte da Câmara Municipal, nos termos do artigo 64º nº 5 al a) LAL ( Lei das Autarquias Locais). No entanto, como refere o artigo 65º/1 da mesma lei, a competência para o licenciamento pode ser delegada no presidente da cãmara, o que não sucedeu.

No entanto, apesar da incompetência do presidente da câmara para a emissão do Alvará, a Câmara veio posteriormente a ratificar este acto nos termos do art 137.º/3 do CPA.




Quanto à licença ambiental

De acordo com o artigo 2º al. h) do DL 173/2008, Instalação é uma unidade técnica fixa na qual são desenvolvidas as actividades constantes do Anexo I do mesmo diploma e outras actividades directamente associadas que tenham uma relação técnica com as actividades exercidas no local e que possam ter efeitos sobre as emissões e a poluição.
Como o parque eólico não é uma instalação nos termos do Anexo I, enquadramos esta actividade de produção de energia na parte final da al. h), isto porque, esta construção tem efeitos poluentes, na medida em que introduz directa e indirectamente, em resultado de acção humana, vibrações e ruído no ar, efeitos susceptíveis de causar entraves, comprometer ou prejudicar o uso e a fruição e outros usos legítimos do ambiente (artigo 2º al. o) iii)), nomeadamente a observação de priolos.
Logo, a licença ambiental devia ter sido requerida nos termos do artigo 11.º do Decreto-Lei 173/2008.
No entanto, lembre-se que a falta de licença ambiental não é impeditiva das operações de construcção, mas, sim, do início da exploração dessa actividade, conforme resulta do artigo 9.º, n.º1 do mesmo Decreto-Lei 173/2008. Recorde-se ainda que a exploração de uma instalação sem esta licença constitui contra-ordenação muito grave ( artigo 32.º n.º1, alínea a) do Decreto-Lei 173/2008).

Quanto à audiência dos interessados

A Constituição consagra, no seu artigo 267.º/1 e 5, um direito “à participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito”, a concretizar por lei. Esta imposição constitucional foi concretizada pelo Código de Procedimento Administrativo ( CPA). De facto, o artigo 8.º deste Código estabelece um princípio da participação, que obriga os orgãos da Administração a assegurarem a participação dos particulares e de organizações, na formação das decisões que a eles disserem respeito. Assim, prevê-se no artigos 100.º e seguintes do CPA a audiência dos interessados, a realizar-se depois da instrução do procedimento. Existem quanto à forma, duas modalidades de audiência: a escrita e a oral. É o orgão instrutor que decide qual delas se justifica no caso concreto ( artigo 100.º/2).
Foi isto que o Presidente da Câmara veio alegar na sua contestação. Ao decidir-se pela oralidade da audiência, este devia convocar os interessados com a antecedência mínima de 8 dias ( 102.º/1, ainda do CPA).
Na contestação diz-se ainda que João Siroco acabou por não comparecer à audiência dos interessados e que, este facto, não constitui motivo de adiamento da mesma. Assim, se de facto se provar ter havido convocação tempestiva dos interessados, e o autor não tiver apresentado a justificação da falta, mencionada no n.º 3 do artigo 102.º do CPA, não havia obrigatoriedade de adiamento da audiência.
De acordo com o que diz o demandado Presidente da Câmara na contestação, a convocação da audiência foi afixada em edital, nos lugares de estilo ( devendo atentar-se no Documento VI, anexo à contestação do Presidente da Câmara, que visa fazer prova do cumprimento desta obrigação) .
Como não houve um procedimento de AIA não se poderá aplicar o que nesse regime se estabelece relativamente à audiência e participação dos interessados.



Quanto à questão do Direito à Informação

O direito à informação dos administrados ( em geral) vem consagrado no artigo 268.º/1 e 2 da CRP, numa dupla vertente, como observa Carla Amado Gomes:
- subjectiva, na medida em que o acesso à informação de arquivos é essencial para que o cidadão compreenda os fundamentos e limites dos seus direitos em face dos poderes públicos ( n.º 1);
- objectiva, ligada à transparência das decisões administrativas, que depende da possibilidade de os cidadãos se informarem sobre os passos do iter procedimental ( n.º 2).
Porém, relativamente ao ambiente, há especialidades, na medida da própria natureza do direito ao ambiente, como um interesse e direito de todos ( 66.º/1, 1ª parte CRP), e mais, a sua protecção constitui um dever de todos ( tanto de entidades públicas como privadas), como resulta dos artigos 66.º/1, 2ª parte, 66.º/2 e 9.º, alíneas d) e e) da CRP. Sendo a protecção do ambiente um dever de todos, mais uma razão para que eventuais restrições ao acesso à informação com incidência ambiental sejam interpretadas de forma restritiva ( como está patente no artigo 11.º/8 da L. Acesso à Informação Ambiental). De facto, a Constituição não pode pedir que os cidadãos cumpram um dever sem atribuir a esses particulares o instrumento mais importante para que estes possam actuar. Porque sem informação não se pode agir. Como refere Carla Amado Gomes, há assim uma dependência do direito de participação nas tomadas de decisões com incidência ambiental em relação ao direito de informação. Pode-se dizer que é um género de dependência funcional.
No nosso ordenamento, relativamente ao direito à informação temos dois diplomas relevantes: a Lei 46/2007 ( Lei de Acesso aos Documentos Administrativos- LADA) e, especificamente em matéria ambiental, a já referida Lei 19/2006 ( Lei de Acesso à informação Ambiental), que transpõe a Directiva 2003/04/CE, e que desenvolve um direito que já resulta da nossa Constituição ( através da conjugação dos artigos 268.º/1 e 2, 37.º/1, 48.º/2, 66.º, 9.º,alínea e) e 20.º/2).
Com base nos princípios da publicidade, transparência, igualdade, justiça e imparcialidade ( artigo 1.º da LADA), consagra-se um acesso à informação em termos muito amplos, sem necessidade de o requerente invocar qualquer interesse ( artigo 5.º da LADA).
Este direito compreende não só a consulta, mas também a reprodução. As restrições ao acesso à informação estão previstas no artigo 6.º.
Mas, conforme resulta do artigo 2.º/1 da LADA, o acesso à informação de matéria ambiental e a sua regulação, é especial relativamente a este regime.
Também na Lei 19/2006 se consagra um acesso amplo à informação ( artigo 6.º/1), prevendo-se também, não só um dever passivo para a Administração, de fornecer a informação quando solicitada ( artigos 6.º/1 e 2.º, alínea a)), mas, também, um dever activo de procurar informar os cidadãos acerca das questões com incidência ambiental, publicitar os procedimentos, criar bases de dados acessíveis ( artigos 2.º, b) e c), 4.º e 5.º, também da Lei 19/2006).
Como já observado, o artigo 6.º/1 prevê o direito de acesso sem necessidade de justificar qualquer interesse por parte do requerente. Assim, resulta que a regra geral é a do acesso de todos a toda a informação ambiental. Para obstar ao acesso à informação, a Administração tem de justificar a recusa com base numa concreta habilitação legal.
Estes motivos de justa recusa estão previstos na lei. Existem impedimentos relativos à própria formulação do pedido ( por exemplo artigos 6.º/2 e 8.º da Lei 19/2006), e restrições relacionadas com a natureza do conteúdo da informação, cuja necessidade de protecção pode impor que se condicione ou exclua o acesso a essa informação. São, essencialmente, os casos previstos no n.º 6 do artigo 11.º da lei 19/2006.
Ora, tendo presente este enquadramento, e tendo João Siroco legitimidade, nos termos dos artigos 6.º/1 e 3.º, alínea f), para a Administração recusar o acesso à informação, tinha de se fundar numa das tais justificações previstas na Lei. Tinha ainda a obrigação de comunicar essa fundamentação e o indeferimento do pedido nos termos do artigo 13.º da Lei 19/2006. Não havendo esta comunicação, e sendo a recusa de acesso ilegítima, João Siroco tinha a possibilidade de impugnar a omissão da Administração ( artigo 14.º/1). Tinha também a faculdade de apresentar queixa perante a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos ( 14.º/2 da mesma Lei 19/2006).
Na contestação invoca-se o artigo 64.º/2 do Código do Procedimento Administrativo ( CPA), para justificar a recusa de acesso. Isto com base na ideia de que não foi provado o interesse legítimo do autor João siroco no acesso à informação. Ora, mesmo que não houvesse interesse legítimo do autor, o que é, no mínimo, discutível, ainda assim, tem de se reconhecer que o acesso à informação ambiental está regulado especialmente, devendo entender-se que o regime constante da Lei 19/2006 prevalece sobre outras normas gerais, como esta invocada do CPA. Assim, como se viu, de acordo com este regime, o autor tinha direito de acesso, independentemente de ter interesse legítimo ou não.
Alega-se ainda que as plantas do projecto foram divulgadas tanto no site da Câmara Municipal como no do Ministério do Ambiente. Em princípio esta justificação poderá ser válida, conforme se irá ver de seguida.
O artigo 10.º/1, 1ª parte da Lei 19/2006 contém a regra geral sobre as formas de disponibilização da informação. Assim, a regra geral é a de que a forma que se deve utilizar é justamente a requisitada pelo requerente. Mas, como regra geral que é, o artigo 10.º tem excepcões, previstas no 10.º/1, in fine e nas alíneas. Parece que este seria um caso enquadrável na alínea a) do n.º1 do artigo 10.º, dado que a informação estava publicamente disponível nos sítios electrónicos referidos, forma essa prevista no artigo 5.º do mesmo diploma.
No entanto, o artigo 10.º/2 impõe que haja uma comunicação ao requerente, onde se fundamentem as razões da recusa, de forma a que o interessado:
- saiba que o seu pedido não foi aceite;
- porque razões não foi aceite; e
- qual a forma que tem para aceder.
Não consta que tenha havido esta comunicação, o que demonstra que não houve a diligência necessária, exigível a um serviço de uma Administração que se quer próxima dos cidadãos, participada e informativa ( 267.º e 268.º da CRP).

Quanto ao princípio da precaução

A associação “Os binócolos Felizes” veio alegar que o projecto de construcção do parque eólico não devia ser autorizado, por ser esta autorização contrária ao princípio da precaução. A vigência de tal princípio ( autonomizado do princípio da prevenção) no nosso ordenamento é discutida pela Doutrina. Gomes Canotilho e Ana Gouveia são a favor desta autonomização, lembrando até, que este princípio foi consagrado ao nível do Direito Comunitário ( artigo 174.º, n.º2 do Tratado que institui a Comunidade Europeia). Vasco Pereira da Silva entende por seu lado, que não há lugar a esta autonomização, defendendo, consequentemente, a ideia de um princípio da prevenção em sentido amplo.
A distinção entre estes princípios está geralmente associada aos tipos de perigos em causa:
- a precaução actuaria em razão de perigos futuros, desconhecidos, e aqueles sobre os quais não haja ainda prova científica irrefutável;
- a prevenção diría respeito, pelo contrário ao riscos conhecidos e provados.
Tanto a distinção, como as decorrências e imposições do princípio da precaução são variáveis na doutrina. Em relação ao (sub) princípio in dubio pro ambiente, deve-se dizer que este não pode ser entendido em termos extremistas. Parece-nos que para a dúvida funcionar em favor do ambiente, esta dúvida tem que ser já uma dúvida razoável, e não uma mera hipótese remota e completamente infundada. Assim, caberia a esta associação invocar os factos que possam indiciar esse mesmo perigo.

Conclusões:

1) A competência, quer para a classificação como PIN+ quer para a dispensa de procedimento de AIA, é dos ministros responsáveis pelas áreas do ambiente da economia e outros em razão da matéria, mediante despacho conjunto.
2) Apesar do procedimento de dispensa de AIA não ser necessário, uma vez que não há sujeição a AIA ( nos termos do artigo 1.º,n.º 3 do Decreto-Lei 69/2000)- por este não ser um projecto inserido na Rede Natura 2000 – a classificação como PIN + desencadeia uma série de efeitos que legitimam os interesses das partes demandadas, nomeadamente a apreciação prioritária junto de quaisquer entidades, órgãos ou serviços da administração – art 7º nº1 alínea b) do DL 285/2007
3) Ainda que a dispensa do procedimento de AIA tivesse sido feita por resolução do Conselho de Ministros, não se verificaria uma incompetência absoluta, mas, antes uma incompetência relativa, geradora de mera anulabilidade.
4) Porém, uma vez que a classificação de um projecto como PIN + feita, num primeiro momento, através de despacho conjunto, apenas produz definitiva e completamente os seus efeitos com a resolução de ministros, e, não tendo esta sido emitida, o referido projecto nunca chegou a produzir efeitos.
5) Também não ocorreu um indeferimento tácito, uma vez que o Governo emitiu o despacho conjunto em 31/03/2009, tendo recebido a proposta de classificação como PIN+ no dia 18/03/2009, dentro do prazo estipulado no artigo 6º nº 2 do DL 285/2007 .
6) Apesar de o plano de pormenor já ter sido sujeito a uma AAE, ao abrigo do DL 232/2007, de 15 de junho, tal não afasta a necessidade de se proceder a uma avaliação de impacte ambiental, atento o disposto no artigo 74º nº 3 do DL 380/99, de 22 de Setembro. Este entendimento resulta também da interpretação ( a contrario) do artigo 13.º do Decreto-Lei 232/2007.
7) Em relação à licença ambiental conclui-se que, apesar de o parque eólico não ser uma instalação nos termos do anexo 1 ao Decreto-Lei 173/2008, ainda assim, deve enquadrar-se esta actividade na parte final da alínea h) do artigo 2.º do mesmo Decreto-Lei, na medida em que esta actividade tem efeitos poluentes e limita o uso e fruição do ambiente. Assim, o início da exploração da instalação, está sujeito à obtenção prévia dessa licença ambiental.
8) Não existindo qualquer procedimento de AIA não se aplicam as regras relativas à audiência dos interessados, previstas no seu regime . Assim, podia ser convocada a audiência ( oral) dos interessados, através de afixação de edital, nos lugares de estilo, não se verificando nenhuma violação das regras contidas nos artigos 100º e ss do CPA.
9) No nosso ordenamento existem dois diplomas relevantes em matéria de direito à informação, sendo que a Lei 19/2006 (lei de acesso à informação ambiental) é especial relativamente ao regime constante da Lei 46/2007 (LADA). Prevendo a Lei 19/2006, no seu artigo 6º nº 1, um acesso amplo à informação, sem necessidade de se alegar interesse legítimo, a Administração tem de justificar a recusa com base numa concreta habilitação legal, fundamentando-a, de forma a que o interessado tenha conhecimento de que o seu pedido não foi aceite, das razões da recusa e da forma que tem para aceder. Conclui-se deste modo que a Administração não cumpriu o imposto pelo art 10º nº2 da lei 19/2006.
10) Carecendo a construção do parque eólico de licenciamento pela Câmara Municipal e, sendo tal competência delegável no presidente da Câmara, o facto de tal não ter ocorrido, não impede que, havendo um posterior acto de ratificação da Câmara a referida incompetência não seja sanável. Pelo que o alvará não enferma de qualquer vício.
11) Pelo que, somos de parecer que apenas deverá proceder parcialmente a acção quanto ao pedido cumulado de intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, devendo os restantes pedidos formulados no âmbito das referidas acções serem indeferidos por não se verificar qualquer invalidade dos actos praticados.


Os Magistrados do Ministério Público