quarta-feira, 13 de maio de 2009

Petição Inicial da Junta de Freguesia do Monte dos Vendavais

Exmo. Senhores Juízes Conselheiros do
Supremo Tribunal Administrativo

A Junta de Freguesia de Monte dos Vendavais, na pessoa do seu presidente Emílio Brontë (artigo 38,º n.º 1 da Lei das Autarquias Locais - Lei 169/99 de 18 de Setembro), vem propor:

Acção Administrativa Especial.

Contra
Conselho de Ministros
O presidente da Câmara Municipal de Vilar de Brisa do Mar
( Sísifo S.A. )

Para
Declaração de nulidade ou anulação da resolução do Conselho de Ministros de dispensa de Avaliação de Impacto Ambiental e do alvará emitido pelo presidente da Câmara Municipal de Vilar de Brisa do Mar, e condenação da Sísifo S.A. à apresentação de Estudo de Impacte Ambiental

Sendo contra-interessados

Nos termos e com os fundamentos seguintes:

Dos Factos:

1º.
A Sísifo S.A. negociou informalmente com a Câmara Municipal de Vilar de Brisa do Mar a instalação de um parque eólico com 15 torres de produção de energia nesse município.

2º.
Foi apresentado ao Governo um pedido para que o projecto fosse considerado de Potencial Interesse Nacional de Importância Estratégica (PIN +).
3.º
Simultaneamente foi requerida a dispensa de avaliação de impacte ambiental (AIA).

4.º
O Governo aprovou, por resolução de Conselho de Ministros, a dispensa de avaliação impacte ambiental (AIA).

5.º
O presidente da Câmara Municipal de Vilar de Brisa do Mar emitiu alvará para o início das obras de instalação do parque eólico.

Do Direito:

6.º
A junta de freguesia é parte legítima ao abrigo do art.º 9.º n.º2 do CPTA e art. 52.º CRP.

7.º
A junta de freguesia assume-se como defensora da legalidade objectiva e da transparência dos procedimentos administrativos.

8.º
Os projectos de potencial interesse nacional classificados como de importância estratégica (PIN +) destinam-se a assegurar uma tramitação célere dos procedimentos administrativos.
9.º
Para obtenção desse estatuto os projectos devem satisfazer os requisitos cumulativos do artigo 2.º n.º3 do D.L. 285/2007, de 17 de Agosto.

10.º
A obtenção de tal estatuto importa a aplicação de um específico regime jurídico.



11.º
Contudo este não implica a dispensa automática da Avaliação de Impacte Ambiental (AIA).

12.º
A AIA é um instrumento preventivo de protecção do ambiente.

13.º
O parque de energia eólica viria a situar-se numa zona designada como Rede Natura 2000. Para efeitos de aplicação do regime da AIA, estes terrenos são considerados área sensível, nos termos do art.º 2.º al. b) ii) do D.L. 69/2000, de 03 de Maio.

14.º
Assim, o número de torres de produção energética necessárias para justificar a avaliação de impacte ambiental é reduzido (10 ou mais).

15.º
O projecto em análise prevê a construção de 15 torres e está, assim, sujeito a AIA, por força do artigo 1º3 b), conjugado com o ponto 3 alínea i) do anexo II do mesmo diploma.

16.º
O facto do plano de pormenor prever uma construção semelhante para o local não exonera o projecto de AIA.

17.º
Efectivamente os planos de ordenamento do território estão sujeitos a avaliação ambiental estratégica (AAE), nos termos do art. 3 n.º1 al. a) do D.L. 232/2007, de 15 de Junho e não a AIA como sugerem os factos.

18.º
Por outro lado, ainda que tal plano tivesse sido sujeito a AAE tal não exoneraria o projecto de AIA. Esta deverá ponderar os resultados da AAE e poderá “(…) remeter para o seu conteúdo e conclusões e fundamentar a eventual divergência com os mesmos” mas nunca poderá a AAE do plano substituir a AIA do projecto, que deve ser “(…) sempre que possível, objecto de avaliação simultaneamente com a avaliação ambiental do respectivo plano ou programa” (arts. 13.º n.º 1 e 4 do D.L. 232/2007, de 15 de Junho).

19.º
Por todo o exposto concluímos que o projecto está sujeito a AIA.

20.º
Importa, contudo, analisar a possibilidade da sua dispensa.

21.º
A dispensa de AIA é uma faculdade do governo, permitida por lei, dependente de iniciativa do proponente, como indica o art.º 3.º nº 1 e 2 do D.L. 69/2000, de 03 de Maio.

22.º
Independentemente da larga margem de liberdade concedida aos órgãos competentes, tal faculdade não deve ser exercida de modo arbitrário e irreflectido no tocante às consequências ambientais da execução do processo.

23.º
A dispensa deve ter por base “(…)circunstâncias excepcionais e devidamente fundamentadas (…)” e indicar os principais efeitos do projecto no ambiente, bem como o juízo de proporcionalidade subjacente à decisão, invocando os valores que justificam o sacrifício ambiental, e a medida desse sacrifício. Tal decorre do art. 3º, nº1 e 2 do referido D.L.

24.º
Por outro lado, o requerente teria sempre que completar o requerimento de dispensa com a descrição do projecto e dos seus efeitos no ambiente (art. 3.º n.º2 in fine do D.L. 69/2000, de 03 de Maio), situação que desconhecemos de todo. Com efeito não temos informação alguma das consequências ambientais de tal projecto.

25.º
Por outro lado, esta dispensa será somente admissível em circunstâncias excepcionais, em casos em que é manifesta a não ingerência negativa no meio ambiente. Assim impõe o art. 2º, nº 3 da Directiva 85/337/CEE de 27 de Junho, bem como o art. 3º, nº 1 do DL 69/2000, de 03 de Maio.

26.º
As circunstâncias em causa não parecem suficientes para justificar uma dispensa de AIA. Os motivos da decisão, pelo seu carácter exíguo, revelam-se incapazes de satisfazer as exigências de uma tal opção.

27.º
Esta insuficiência de motivos reflecte-se numa ultrapassagem da margem de livre apreciação. Desta forma, o acto de dispensa é anulável nos termos gerais do art. 135.º CPA.

28.º
Ainda que não fosse exigência da lei nacional sê-lo-ia por força das directivas 97/11/CE e 85/337/CEE, pela norma contida nas mesmas apresentar clareza e precisão, ser incondicional e não necessitar de outras concretizações para ser eficaz (Acórdãos Van Gend en Loos, Van Duyn…).

29.º
A exigência de excepcionalidade é mais do que um convite à prudência do decisor, é uma efectiva limitação à margem de livre decisão administrativa, susceptível de impugnação judicial. Como tal, caso não se prove a excepcionalidade do caso, o juiz pode e deve ordenar a prática de AIA, que, não apenas é uma formalidade, constitui um acto devido aos particulares em geral.

30.º
Não foi informada a Comissão Europeia, tal como impunha o art. 3.º n.º 8 do D.L. em questão

31.º
Por outro lado, os princípios constitucionais do direito a um ambiente saudável e ecologicamente equilibrado bem como a protecção da natureza e preservação dos recursos naturais (artgs 66.º e 9.º al. e) CRP) sempre levariam à conclusão de que, neste caso concreto, em razão dos efeitos no ambiente de um tal projecto, se justificaria a realização efectiva, i.e. , sem possibilidade de dispensa, de AIA.

32.º
Assim, no caso em análise, a dispensa de AIA revela-se também inconstitucional. Ofendendo os direitos já referidos no seu conteúdo essencial, já que compromete qualquer consideração ambiental no processo de decisão, o acto de dispensa de AIA é nulo por preencher a modalidade do vício prevista no 133º2 d) CPA

33.º
Existe, ainda, uma outra invalidade a apontar a tal decisão. Com efeito, a mesma deve ser, nos termos do art.º 3.º n.º 1 do D.L. 69/2000, de 03 de Maio, efectuada por “(…) despacho do ministro responsável pela área do ambiente e do ministro da tutela (…)”. Contudo, no caso em apreço, a dispensa revestiu a forma de resolução de Conselho de Ministro, tendo sido aprovada por este órgão. Ora tendo o Conselho de Ministros e cada Ministério atribuições distintas entre si, apesar de pertencerem à mesma pessoa colectiva, e não existindo uma relação de hierarquia directa entre os órgãos envolvidos, mas apenas subordinação política (cfr art.º 191.º da CRP), a decisão de dispensa enferma, nesta matéria, de um vicio de incompetência absoluta.

34.º
O acto é, portanto, nulo, nos termos do artigo 133.º n.º 1 e 2 al. b) CPA.



35.º
A junta de freguesia não pretende frustrar a construção de infra-estruturas tout court. O desenvolvimento sustentável do país corresponde a uma finalidade essencial prosseguida pelas autarquias locais.

36.º
Todavia, esse desenvolvimento deverá ser realizado de forma prudente, com respeito a uma ponderação de valores.

37.º
Ao dispensar a AIA o Governo desconsiderou os efeitos ambientais do projecto. Contudo, em lugar algum ficou demonstrado que o projecto não teria efeitos deletérios para o ambiente.

38.º
Existem outras ilegalidades a apontar ao processo de licenciamento.

39.º
Com efeito, não sendo a dispensa de AIA válida, falta um pressuposto para a emissão de licença de construção. (art.º 20.º do D.L. 69/2000, de 03 de Maio).

40.º
Licença de construção que, por visto, nem chegou a ser emitida, o que inviabiliza a emissão de alvará de construção.

41.º
Desta forma, o alvará emitido não pode senão ser considerado como inválido e ineficaz. Tal alvará é anulável nos termos do art.º 135.º CPA.

42.º
Temos, portanto, um acto de não licenciamento. Desta forma os actos materialmente praticados revelam-se desprovidos de um qualquer fundamento jurídico.

Nestes termos,
Deve a presente acção ser julgada procedente e , em consequência:
A) Ser declarado nulo a resolução do Conselho de Ministros;
B) Subsidiariamente, ser tal acto anulado.
C) Ser anulado o alvará.
D) Ser a Sísifo S.A. condenada à apresentação de Estudo de Impacte Ambiental caso pretenda prosseguir com o projecto.

Valor da Acção: 200.000.001€